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23/11/2021

A incidência de INSS, FGTS e Imposto sobre a Renda no bônus de contratação

O bônus de contratação é uma verba geralmente utilizada por empresas para atrair um profissional almejado, funcionando como um incentivo para que o colaborador passe a integrar seus quadros.

Contudo, no que se refere aos reflexos que essa parcela possui, tanto em relação aos de natureza trabalhista, quanto aos de natureza tributária, as dúvidas são frequentes e se pautam, principalmente, nos seguintes questionamentos: sobre o pagamento do bônus de contratação incide INSS, FGTS e Imposto sobre a Renda?

 

Tributação pelo Imposto sobre a Renda sobre o bônus de contratação

A tributação pelo Imposto sobre a Renda, por meio de retenção na fonte com posterior ajuste na declaração da pessoa física referente ao ano calendário do recebimento do bônus de contratação tem sido o procedimento adequado quando do pagamento/recebimento da verba.

Dúvida maior, porém, persiste em relação à incidência de contribuição previdenciária ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e ao depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

 

Incidência de INSS e FGTS sobre o pagamento do bônus de contratação

As decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), bem como do Tribunal Superior do Trabalho (TST), nos ajudam a entender as repercussões trabalhistas e tributárias do pagamento do bônus de contratação.

 

Decisões do CARF a respeito do bônus de contratação

Existem decisões do CARF que atribuem ao bônus de contratação natureza salarial, entendendo pela incidência da contribuição previdenciária sobre a verba.

Nessa hipótese específica, entende-se que sendo o pagamento do bônus de contratação vinculado a certas condições contratuais, como estabelecimento de cumprimento de metas ou até mesmo exigência de devolução do valor pago caso o recém-contratado não permanecesse na sociedade por um prazo mínimo acordado, restaria configurada sua natureza remuneratória.

Vejamos trecho de julgamento proferido pelo CARF em sessão realizada em 06/08/2019 no qual se entendeu que o bônus de contratação teria natureza salarial e, portanto, atraía a incidência da contribuição previdenciária:

Para que os pagamentos a título de bônus de contratação e extraordinários não integrem o salário-de-contribuição é necessário verificar o atendimento de requisitos como pagamento desvinculado do salário, sem habitualidade, não condicionado a metas ou prazo mínimo de permanência. Tais situações, se verificadas, acabam por vincular o pagamento ao trabalho, indiretamente ao salário e, por consequência, caracterizam-se como salário-de contribuição.

No caso em comento tal pagamento se evidencia como antecipação salarial pela contraprestação do trabalho pelo tempo que o contratado deve permanecer vinculado à empresa, o que revela sua feição nitidamente remuneratória em detrimento da natureza indenizatória defendida, uma vez que esta resta desconfigurada diante do fato de haver previsão contratual de devolução dos valores em caso de pedido de demissão ou dispensa por justa causa, antes do prazo estabelecido no momento da avença. (CARF, Acórdão nº 2201-005.314).

Contudo, o entendimento acima – em primeiro momento majoritário no âmbito administrativo-fiscal – vem sendo alterado.

 

O atual posicionamento do CARF a respeito do bônus de contratação

Nesse sentido, em sessão realizada em 08/10/2019, a 2ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 2ª Seção de Julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) do Ministério da Economia decidiu que não incide contribuição social previdenciária sobre os valores pagos a título de bônus de contratação, ainda que realizados de maneira parcelada.

No julgamento, firmou-se a seguinte tese:

Não integra o conceito de salário-de-contribuição os valores pagos à título de bônus de contratação (também denominado de “luvas” ou “hiring bonus”) quando não restar demonstrado que foram pagos em decorrência da prestação de serviços”, logo, não legitimando a aplicação de contribuições sociais sobre estas verbas (PAF 16327.001666/2010-12 – Acórdão 2402-007.616).

A fiscalização que deu ensejo à lavratura do Auto de Infração havia entendido que o bônus de contratação não teria natureza indenizatória, configurando-se como antecipação de salário.

Contudo, por meio da decisão mencionada, o CARF consignou a natureza indenizatória do bônus de contratação, afirmando que não incide contribuição previdenciária ao Instituto Nacional do Seguro Social sobre essa parcela.

Em outras palavras, entendeu-se que o valor pago a título de bônus de contratação não é decorrente de efetiva retribuição pelo serviço e se refere, em verdade, a valor relativo à fase pré-contratual, tendo em vista que a relação de trabalho entre as partes nem ao menos teria se iniciado, o que afasta a incidência de contribuição previdenciária.

Chamamos atenção, porém, que o CARF possuía um entendimento sobre o tema e, como visto, posteriormente veio a decidir em sentido contrário, o que indica que o posicionamento atual (de que não incide contribuição previdenciária sobre o bônus de contratação) pode vir a ser novamente alterado.

 

Decisões do TST a respeito do bônus de contratação

O entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem sido no sentido oposto ao atual posicionamento do CARF, isto é, o TST vem entendendo que o bônus de contratação possui natureza salarial.

Para exemplificar, veja julgado do TST sobre o tema:

I. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014. HORAS EXTRAS. CARGO DE CONFIANÇA. AUSÊNCIA DE CARTÕES DE PONTO. O TRIBUNAL REGIONAL, APÓS MINUCIOSA ANÁLISE DA PROVA PRODUZIDA, EM ESPECIAL A TESTEMUNHAL, CONCLUIU QUE O AUTOR DETINHA CARGO EM COMISSÃO, POIS FOI SUPERINTENDENTE DE PRODUTOS E DIRETOR COMERCIAL, COM PERMISSÃO PARA DEMITIR, ADMITIR, ADVERTIR E FIXAR FÉRIAS DOS SUBORDINADOS, NÃO TINHA CONTROLE DE HORÁRIO, NÃO ERA FISCALIZADO E NÃO JUSTIFICAVA FALTAS, ATRASOS E SAÍDAS ANTECIPADAS, E, ALÉM DISSO, DETINHA PADRÃO REMUNERATÓRIO DIFERENCIADO, POIS SUA REMUNERAÇÃO PARA FINS RESCISÓRIOS FOI DE R$ 34.004,61. AS ALEGAÇÕES RECURSAIS DESAFIAM A MATÉRIA FÁTICA PERFEITAMENTE DELINEADA PELO TRIBUNAL REGIONAL, INSUSCETÍVEL DE REVISÃO NESTA SEARA RECURSAL EXTRAORDINÁRIA, NOS TERMOS DA SÚMULA Nº 126 DO TST. Inviável, portanto, a aferição de violação do artigo 62, II, da CLT, da Súmula do TST e da divergência jurisprudencial em torno de prova. Por fim, a insurgência recursal quanto aos cartões de ponto carece do prequestionamento a que alude a Súmula nº 297, I e II, do TST. Agravo de instrumento a que se nega provimento. BÔNUS ANUAL/PPR. O Tribunal manteve o indeferimento do bônus salarial/PPR, porque seu valor não era fixo, já que dependia de avaliações individuais dos resultados obtidos pela empresa no período. Para se chegar à conclusão fática pretendida pela parte reclamante e diversa da delimitada pelo TRT, seria necessária a apreciação do conjunto fático e probatório, o que é vedado a teor da Súmula nº 126 do TST. Agravo de instrumento a que se nega provimento. CONTRATO DE LUVAS. NATUREZA SALARIAL. A insurgência não será apreciada, porque o apelo foi admitido pelo Tribunal de origem. Agravo de instrumento a que se nega provimento. MULTAS NORMATIVAS. O Tribunal Regional decidiu que são indevidas as multas normativas, já que não foram violadas as cláusulas normativas. Nesse aspecto, a decisão regional não contrariou a Súmula nº 384, II, do TST, porque não existiu ofensa às cláusulas normativas. Agravo de instrumento a que se nega provimento. II. RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014. BÔNUS DE CONTRATAÇÃO. NATUREZA JURÍDICA. O TST firmou o entendimento no sentido de que o bônus concedido ao empregado na data da sua contratação, com o objetivo de atraí-lo a integrar o quadro funcional da empresa, possui natureza salarial. Recurso de revista conhecido e provido. (TST; ARR 0002148-72.2015.5.02.0035; Segunda Turma; Relª Min. Maria Helena Mallmann; DEJT 27/11/2020; Pág. 991)

Contudo, apesar de concluir pela natureza salarial, o entendimento do TST é no sentido de que, por ser paga apenas uma vez (ainda que por vezes de forma parcelada), os reflexos do pagamento do bônus de contratação se limitam ao depósito do FGTS referente ao mês do pagamento e à indenização de 40% sobre o saldo.

Especificamente sobre este ponto, vejamos recentíssimo julgado do TST:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO RÉU. LEI 13.467/2017 . BÔNUS CONTRATAÇÃO (HIRING). NATUREZA JURÍDICA SALARIAL. REFLEXOS. LIMITAÇÃO. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA CONSTATADA . Em se tratando de recurso em face de acórdão regional que contrariou iterativa, notória e atual jurisprudência desta Corte, revela-se presente a transcendência política da causa (inciso II do § 1º do aludido dispositivo), a justificar o prosseguimento do exame do apelo. Agravo de instrumento a que se dá provimento para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido demonstrada possível contrariedade à Súmula nº 253 do TST. RECURSO DE REVISTA DO RÉU . BÔNUS CONTRATAÇÃO (HIRING). NATUREZA JURÍDICA SALARIAL. REFLEXOS. LIMITAÇÃO. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA CONSTATADA . O entendimento desta Corte é de que a parcela denominada “hiring bônus” possui natureza salarial. No entanto, seus reflexos são limitados ao depósito do FGTS referente ao mês de pagamento da verba, bem como à respectiva indenização de 40%, por aplicação analógica da Súmula nº 253. Precedentes. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido. (TST, RR: 10001536620155020371, Rel. Min. Claudio Mascarenhas Brandao, j. 10/11/2021, 7ª Turma, DJe: 19/11/2021)

Assim, resta claro que o posicionamento final da instância trabalhista superior acerca dessa matéria segue a mesma linha do mais recente entendimento do CARF, qual seja, a inviabilidade de incidência de contribuições previdenciárias sobre o bônus de contratação.

 

Conclusão

Apesar de haver certa divergência de posicionamentos, entre o CARF e o TST, quanto a natureza do bônus de contratação, tal não impede que se adote um posicionamento unânime sobre os reflexos da parcela.

Assim, da análise dos posicionamentos do CARF e do TST, nota-se uma convergência no seguinte sentido: pela tributação pelo Imposto sobre a Renda, pela não incidência de INSS e pela incidência de FGTS referente ao mês do pagamento e à indenização de 40%, a depender da modalidade rescisória.

 

Gabriela Pelles Schneider

Advogada. Mestre em direitos e garantias fundamentais pela FGV.

 

Cristina de Freitas Caiado Machado