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Nova Lei de Licitações, parte 3: o que muda nas modalidades de licitação e as oportunidades de inovação oferecidas pela legislação
Dando continuidade aos nossos breves informativos sobre a Lei nº 14.133/21 (doravante LLCA), vejamos, primeiro, o que foi trazido de novo em relação às modalidades de licitação.
Antes, a legislação brasileira previa as modalidades concorrência, pregão, concurso, leilão, convite, tomada de preços e Regime Diferenciado de Contratação (RDC), espalhadas entre as Leis nº 8.666/93, nº 10.520/02 e nº 12.462/12. Com a LLCA, as modalidades foram compiladas em uma única lei, sendo extintos o RDC, a tomada de preços e o convite. Sobraram, então, a concorrência, o pregão, o concurso e o leilão, além de ter sido acrescido o diálogo competitivo.
A extinção da tomada de preços e do convite (modalidades que, junto à concorrência, compunham o grupo das “modalidades comuns”), somada à equiparação do procedimento da concorrência e do pregão (art. 29), demonstram que o escopo da LLCA é a simplificação procedimental. Agora, na contratação de bens e serviços e de obras e serviços de engenharia, é indiferente se o agente de contratação fizer uma concorrência ou um pregão; ambos seguirão o procedimento do art. 17, estando consolidada a fase de habilitação como posterior ao julgamento das propostas. Para ilustrar o ganho de eficiência que essa mudança proporciona, basta imaginar, antes da LLCA, uma concorrência em que a Administração habilita trinta particulares, mas apenas três deles apresentam propostas competitivas na fase de julgamento. O tempo e o esforço perdidos foram enormes.
Como o pregão é atualmente responsável por mais de 80% das contratações públicas, a manutenção da “concorrência” enquanto modalidade não parece fazer muito sentido. Há a exigência de concorrência para a contratação de “bens e serviços especiais” e “obras e serviços especiais de engenharia” (art. 29, parágrafo único), embora o conceito “especial” siga indeterminado; bem como para a realização de concessões de serviço público (art. 179). Mas, dada a identidade no procedimento, concorrência e pregão poderiam ter sido unidos numa modalidade só. Vale destacar que os critérios de julgamento também não servem à classificação inequívoca das duas referidas modalidades, porquanto os critérios do pregão (menor preço ou maior desconto) já estão previstos no inciso XXXVIII do art. 6º, que contém o rol de possíveis critérios de julgamento da concorrência. Logo, são procedimentos iguais, mas um deles com menos critérios de julgamento possíveis do que o outro.
Já o leilão e o concurso praticamente não sofreram alteração alguma. As hipóteses em que ambos são recomendados continuam as mesmas,[1] os editais devem conter informações básicas sobre a licitação e, como ponto positivo, não há procedimento previsto em lei. O art. 31, por exemplo, fala na confecção de um “regulamento” para os procedimentos operacionais do leilão, mas o próprio edital do leilão pode tranquilamente suprir essa necessidade. Leilões com editais de 3 ou 4 dispositivos têm sido uma tendência benéfica.
Para finalizar o tópico das modalidades, falemos da grande novidade da LLCA: o diálogo competitivo. Essa modalidade autoriza uma interação monitorada entre a Administração e os licitantes, com fins de desenvolvimento de produtos ou serviços sob medida. Por isso, seu uso é reservado a objetos contratuais que envolvam inovação tecnológica e alta complexidade, nos quais a Administração requer inputs do mercado para identificar as soluções existentes e, então, definir as especificidades do que irá contratar.
As alíneas “b” e “c” do inciso I do art. 32, por sinal, são particularmente relevantes: definem como condições inafastáveis, para a licitação mediante diálogo competitivo, a impossibilidade de o ente contratante ter sua necessidade satisfeita sem a adaptação de soluções disponíveis no mercado; e a impossibilidade de as especificações técnicas serem definidas com precisão suficiente pela Administração. Ou seja, o serviço buscado pelo poder público tem de ter tecnologia pioneira na área, sem possibilidade de “readequação” de uma tecnologia já utilizada e posta em prática pela Administração, relacionada a outro serviço. Ademais, as discussões posteriores à pré-seleção dos licitantes podem envolver não apenas a definição do objeto a ser contratado, mas também a estrutura e as condições contratuais, como prazos, fases de desenvolvimento, fornecimento do objeto e modo de remuneração do licitante. É algo bem flexível.
A grande vantagem do diálogo competitivo, porém, é justamente ser uma modalidade de licitação: a interação entre Administração e iniciativa privada se vincula à disputa pela contratação do serviço – ou seja, haverá contratação. Isso difere do Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI), instituído pelo Decreto n.º 8.428/15, em que não há garantia alguma de que a futura licitação será realizada e que, por conseguinte, os investimentos despendidos na realização dos estudos serão ressarcidos.
Muito bem.
Esmiuçadas as mudanças nas modalidades de licitação, é pertinente darmos destaque a um dispositivo realmente inédito: o parágrafo único do art. 11.[2] Ele deixa claro que passa a ser uma prioridade dos entes públicos a estruturação de procedimentos próprios para as licitações e para o monitoramento dos contratos firmados. Portanto, teremos cada vez mais licitações regidas pelos editais, com procedimentos simplificados e consolidados em todas as contratações daquele ente, e não por uma tentativa de “obediência cega” à LLCA, que ainda peca na “supernormatização” das relações entre Administração e particulares.
Thiago Ferreira Siqueira
Advogado. Pós-doutor em direito processual pela UFES.
Lorenzo Caser Mill
Advogado. Mestrando em direito processual pela UFES.
[1] Leilão para alienação de bens imóveis ou de bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos a quem oferecer o maior lance; e concurso para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, cujo critério de julgamento será o de melhor técnica ou conteúdo artístico, e para concessão de prêmio ou remuneração ao vencedor.
[2] Art. 11 […] Parágrafo único. A alta administração do órgão ou entidade é responsável pela governança das contratações e deve implementar processos e estruturas, inclusive de gestão de riscos e controles internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e os respectivos contratos, com o intuito de alcançar os objetivos estabelecidos no caput deste artigo, promover um ambiente íntegro e confiável, assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento estratégico e às leis orçamentárias e promover eficiência, efetividade e eficácia em suas contratações.