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19/12/2023

Tema 1.015 STF: é inconstitucional a vedação à posse em cargo público de candidato aprovado em concurso que esteve acometido de doença grave, mas que não apresenta sintomas atuais de restrição laboral

As possíveis vedações arbitrárias ao acesso a cargos públicos é matéria recorrente na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Tais casos, revestidos de repercussão geral, têm sido julgados pelas Turmas e pelo Tribunal Pleno do STF, como ocorreu com o Recurso Extraordinário nº 560.900/DF, que decidiu pela ilegitimidade da cláusula de edital de concurso público que determine a restrição de candidatos que respondem a inquérito ou ação penal.

Nesta toada, no último dia 30 de novembro, o Pleno do Supremo Tribunal Federal julgou o Recurso Extraordinário nº 886.131/MG (tema 1.015) e por unanimidade decidiu pela inconstitucionalidade da vedação à posse em cargo público de candidato aprovado no certame que tenha sido anteriormente acometido de doença grave, mas que atualmente não apresenta sintoma incapacitante nem restrição relevante para impedir o exercício da função pretendida.

 

O que originou o Tema 1.015

O leading case envolve uma candidata aprovada em concurso público para o cargo de Oficial Judiciário do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e que, após a sua nomeação, foi considerada inapta pela junta médica do certame para assumir a função.

A vedação à posse no cargo público foi justificada, no caso, na previsão estabelecida no item 19.9 §1º do Manual de Perícias Médicas do TJMG, que proíbe a admissão de candidatas portadoras de carcinomas/câncer ginecológicos ou que tenham sido acometidas pela doença e ainda não tenha transcorrido o período de cinco anos após o término de seus tratamentos.

No caso concreto, a candidata nomeada adquirira carcinoma mamário (câncer de mama) e já teria realizado todo o tratamento da doença. Ainda assim, foi impedida de tomar posse do cargo público, já que à época de sua posse, só haviam transcorridos 18 meses desde a sua cirurgia mamária.

Diante disso, a candidata propôs ação contra o Estado de Minas Gerais, objetivando a declaração de nulidade do parecer desfavorável da Junta Médica do TJMG que a considerou inapta no exame de saúde, para assim ter seu direito à posse no cargo público reconhecido. Na primeira instância, o pedido autoral foi julgado procedente, porém em grau de apelação a sentença foi reformada pelo TJMG. A candidata, então, interpôs recurso extraordinário baseando-o nas ofensas aos artigos 1°, inciso III, 5º, caput e incisos I e III, e 6º da Constituição Federal.

 

Repercussão Geral

O Min. Relator do recurso extraordinário, Luís Roberto Barroso, pontuou a repercussão geral do caso pela premissa de envolver questão constitucional relevante, rodeando os princípios da isonomia, da dignidade humana e do amplo acesso a cargos públicos.

Além de estar relacionada a direitos fundamentais de inegável interesse jurídico, a matéria possui repercussão geral sob os pontos de vista político, na medida em que envolve diretrizes de contratação de servidores públicos, e social, pois são inúmeras as pessoas já acometidas de doenças graves que vêm a prestar concurso públicos.”

Em sua manifestação, Roberto Barroso pontou que, por um lado, o Estado tem a prerrogativa de selecionar, mediante a realização de concurso público, os candidatos que possuem a capacidade intelectual e física para desempenhar funções públicas. De outro, todos os candidatos possuem o direito de serem tratados com dignidade e de forma isonômica.

 

Apreciação do Tema 1.015 pelo STF

No julgamento do recurso extraordinário, realizado em 30/11/2023, o Tribunal Pleno, por unanimidade, seguindo o voto do Min. Relator, deu parcial provimento para condenar o Estado de Minas Gerais a nomear e dar posse à recorrente/candidata.

A tese de repercussão geral fixada no Tema 1.015 foi a seguinte: “É inconstitucional a vedação à posse em cargo público de candidato(a) aprovado(a) que, embora tenha sido acometido(a) por doença grave, não apresenta sintoma incapacitante nem possui restrição relevante que impeça o exercício da função pretendida (CF, arts. 1º, III, 3º, IV, 5º, caput, 37, caput, I e II)”.

Ressalta-se que o inteiro teor do acórdão ainda não foi publicado, porém, sem dúvida alguma, tal tese fixada em sede de repercussão geral impactará diversos processos judiciais em curso no país, já que, a partir dela, nenhum candidato em concurso público poderá ter o seu direito de acesso ao cargo público restringido pelo fato de ter sido, no passado, acometido por doença grave, caso não persista nenhum sintoma incapacitante.

 

Thiago Ferreira Siqueira

Pós-doutor (UFES), Doutor (USP) e Mestre (UFES) em direito processual civil. Professor dos cursos de graduação e mestrado da UFES. Advogado e parecerista.

 

Regina Zocolotti Dórea

Graduanda em Direito pela UFES. Estagiária.