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12/06/2021

Pontos relevantes no texto proposto da Reforma Tributária

Após muitas discussões e críticas, foi apresentado, no mês passado, o relatório da reforma tributária, da relatoria do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).

A possível reforma, que tem como base os textos das Propostas de Emenda Constitucional nº 45 e 110, ambas de 2019, e o Projeto de Lei 3.87/2020, busca, principalmente, aprimorar a tributação sobre bens e serviços, dado que as maiores críticas são direcionadas ao setor de consumo.

O texto da Reforma Tributária busca, nas palavras do relator, “congregar aspectos técnicos que reputamos essenciais à formulação de uma matriz tributária moderna, capaz de oferecer condições para impulsionar o crescimento econômico do país, sem desconsiderar especificidades da realidade brasileira”.

Atualmente, os diversos tributos em voga no Brasil, com suas múltiplas alíquotas e isenções, acarretam discussões judiciais e administrativas sobre o caráter fiscal de bens e serviços, gerando ineficiência econômica, perda de arrecadação, e alto custo para as empresas contribuintes. Por outro lado, em decorrência da evolução tecnológica, torna-se cada mais difícil distinguir entre a produção de bens e de serviços, sendo urgente a extinção desta diferenciação para objetivos fiscais.

Diante da necessidade de alcançar competitividade e atratividade ao mercado brasileiro, gerar emprego e renda e, consequentemente, contribuir para uma sociedade mais próspera, urge a necessidade de um sistema tributário menos burocrático. Não será dessa vez que a carga tributária no país irá diminuir. O que se propõe com essa reforma é desburocratizar o sistema e, principalmente, retirar o peso da tributação sobre o consumo, compensando-o em bens e serviços.

Espera-se, dessa forma, o alcance de uma justiça social, já que aliviaria o setor de consumo que é aquele para o qual a maior parte da população brasileira direciona sua receita.

Com isto, passamos à análise de alguns apontamentos relevantes do texto da Reforma Tributária, assim como alguns de seus desdobramentos

 

Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Imposto Seletivo

O texto apresentado sugere que seriam extintos o PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS para a criação de um tributo único, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com a possibilidade de criação do Imposto Seletivo.

 

Transição da reforma tributária

O texto propõe uma transição iniciada por uma fase teste de dois anos, em que o PIS e a Cofins serão substituídos pela alíquota federal do IBS. Na fase seguinte, as alíquotas do ICMS e do ISS serão reduzidas de forma gradual, à razão de ¼ por ano, até a extinção dos impostos. O IPI, por fim, seria extinto no sexto ano, de forma concomitante à criação de um imposto seletivo.

 

Vantagens

O IBS seria formulado na tentativa de seguir as melhores práticas internacionais para a tributação, quais sejam: (i) base ampla de bens e serviços, (ii) alíquota uniforme cobrada “por fora”, (iii) tributação no destino, com ônus econômico e arrecadação ao erário ocorrendo no local aonde o bem ou serviço for consumido, (iv) crédito amplo e ressarcimento ágil de créditos, (v) desoneração total de exportações e investimentos, e (vi) arrecadação centralizada, com gestão compartilhada entre União, Estados ou Distrito Federal e Municípios.

 

Alíquota

O IBS sobre cada operação seria, no quadro delineado pelo relatório, calculado pelo somatório de três alíquotas: da União, dos estados ou Distrito Federal e dos municípios. Tais entes fixarão suas alíquotas por lei ordinária. Ainda que fixada individualmente, a meta é fixar a mesma alíquota para todas as operações com bens ou serviços, o que atenderia ao ensejo por um sistema tributário menos burocrático e complexo. Até o ente federativo estabelecer a respectiva alíquota, prevaleceria a “alíquota de referência” determinada pelo Senado Federal.

 

Base de cálculo

Se o texto delineado for aprovado, o IBS poderá incidir sobre qualquer operação com bem, material ou imaterial, ou serviço, inclusive direitos a ele relacionados, nos termos definidos em lei complementar. Competirá a este instrumento normativo traçar as condições em que determinada pessoa, física ou jurídica, será contribuinte do imposto.

Esta mudança busca acompanhar a dinamicidade do mundo real, acentuada pela evolução tecnológica, cada vez mais célere, e que traz uma série de operações atualmente não contempladas nos conceitos brasileiros de “bens” e “serviços”.

 

Legislação

A legislação do imposto será única e nacional, instituída por lei complementar, e imporá idênticas restrições legislativas a toda Federação. A autonomia tributária das três esferas governamentais será limitada à fixação de sua respectiva alíquota em lei ordinária. Excetuam-se do regramento da alíquota única somente as hipóteses autorizadas pela Constituição Federal.

 

Não cumulatividade e creditamento

O IBS também será não cumulativo. Característica que se planeja ser simples, e que garanta o efetivo ressarcimento dos créditos aos contribuintes. Será previsto, caso o relatório seja aprovado, o creditamento sobre todas as operações anteriores, excetuando-se apenas as caracterizadas como de uso ou consumo pessoal por lei complementar.

Para garantir o ressarcimento, a proposta é de que a receita arrecadada com o imposto incidente sobre as operações geradoras de crédito não componha o produto da arrecadação que será distribuída aos entes federados, o valor será retido, e funcionará como lastro para o ressarcimento ao contribuinte até que o titular do crédito o utilize para compensá-lo com seus débitos.

Em contrapartida, o aproveitamento do crédito será condicionado ao efetivo recolhimento do imposto incidente na operação, e no momento de sua liquidação financeira, com utilização da evolução tecnológica para tanto, e se aproveitando da facilidade na constatação do valor efetivamente devido pela alíquota única e base de cálculo ampla.

Em conclusão, o efetivo recolhimento do imposto na operação anterior é o que vai garantir que existam recursos para se proceder à devolução dos créditos acumulados.

 

Simples Nacional

O relatório mantém a base constitucional do regime do Simples Nacional, com necessárias alterações que competirão à legislação infraconstitucional. Sucessivas alterações na sistemática a afastaram de seu objetivo original, tornando-o disfuncional, completo e injusto.

Ressalta que há necessidade de corrigir o expressivo limite autorizado para enquadramento (4,8 milhões de reais), os setores autorizados, e a discussão sobre as alíquotas aplicáveis às diversas bases tributárias.

Ainda assim, ocorrerão adequações no substitutivo. No relatório incita-se que o optante pelo Simples Nacional poderá escolher entre incluir ou não o IBS no regime de recolhimento unificado. Se o imposto for incluído, a micro ou pequena empresa não aproveitará ou repassará créditos de suas aquisições e vendas. Seria o caso de empresas enquadradas no Simples que lidem diretamente com o consumidor final, e que possuam poucos insumos creditáveis.

O contribuinte poderá optar por recolher o imposto separadamente, conforme regime ordinário de tributação, adquirindo e repassando créditos normalmente.

 

Benefícios fiscais por prazo determinado

Benefícios vigentes terão prazo de transição de doze anos, com possibilidade de manutenção por prazo à maior razoável.

Dentre estes estão os conferidos às atividades agropecuárias, agroindustriais, pesqueiras e florestas, à saúde, à educação (como exemplo, o ProUni), ao transporte público coletivo, aos fretes do transporte rodoviário de carga, e à regra imunizante das extintas contribuições sociais às entidades beneficentes de assistência social, já previstas na Constituição.

Após tal prazo, o IBS atenderá à regra de incidência geral tida na Constituição Federal, e tratamentos diferenciados só serão conferidos nas restritas hipóteses previstas como de absoluta necessidade.

O texto ainda será objeto de discussão no Congresso Nacional, mas a expectativa do Ministério da Economia é que a Reforma Tributária seja aprovada em cerca de cinco meses.

 

Thaís Borgo Barreto

Advogada. Especialista em direito processual civil pela FDV.