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29/04/2021

Obrigação do empregador em relação ao novo exame toxicológico para motoristas profissionais

A Lei 13.103 de 2015, que ficou conhecida como “A Lei do Caminhoneiro” ou “Lei do Motorista”, incluiu ao Código de Trânsito Brasileiro (CTB) o dever dos condutores das categorias C, D e E de realização de exames toxicológicos para habilitação e renovação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH).

Aquela Lei publicada em 2015 alterou e incluiu diversos dispositivos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e no Código de Trânsito Brasileiro (CTB).

Na CLT, a Lei de 2015 incluiu a exigência de exames toxicológicos, previamente à admissão e em virtude do desligamento, quando se tratar de motorista profissional empregado (§ 6º, artigo 168). Ainda, firmou a obrigatoriedade de realização do exame toxicológico com janela de detecção mínima de 90 (noventa) dias, específico para substâncias que causem dependência ou, comprovadamente, comprometam a capacidade de direção do motorista.

Naquela oportunidade, a Portaria n.º 116 do Ministério do Trabalho e Previdência Social regulamentou a realização dos exames previstos nos parágrafos 6º e 7º do artigo 168 da CLT, estabelecendo que as despesas com os exames realizados quando da admissão ou demissão do empregado devem ser suportadas pelo empregador.

A partir de então, a obrigatoriedade do exame toxicológico de larga janela de detecção passou a vigorar também para os casos de admissão e desligamento de motoristas das referidas categorias, contratados como celetistas.

Recentemente – precisamente em 12 de abril do corrente ano –, entrou em vigor a Lei nº 14.071/2020, que popularmente tem sido chamada de “Nova Lei de Trânsito”, trazendo uma série de alterações no CTB, mas não ensejando nenhuma alteração na CLT.

Como consequência da nova Lei, os motoristas profissionais das categorias C, D e E, que antes tinham o dever de realizar o exame, agora precisam não só realizá-lo, mas também comprovar resultado negativo no toxicológico (art. 148-A, caput, CTB). Além da necessidade de comprovação do resultado negativo no exame toxicológico para obtenção e renovação da CNH, os motoristas das categorias C, D e E, também serão submetidos a novo exame a cada período de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses, a partir da obtenção da CNH (§ 2º, art. 148-A, CTB).

Antes do advento da Lei 14.071/2020, a penalidade de suspensão da carteira por três meses era aplicada somente aos motoristas que recebessem resultado positivo no toxicológico.

Agora, além dessa possibilidade, foi adicionada ao CTB uma nova infração, a fim de tornar mais rígidas as normas para motoristas das categorias C, D e E. Essa mudança está contida no artigo 165-B do CTB, que prevê as penalidades aos motoristas que dirigirem sem realizar o toxicológico obrigatório (art. 165-A, caput) e aos que, na renovação, tiverem constatada a falta do exame exigido a cada 2 anos e 6 meses (art. 165-A, parágrafo único).

Assim, com a inclusão do artigo 165-B ao CTB, a partir da Lei 14.071/2020, o motorista com habilitação para as categorias C, D e E que conduzir veículo sem ter realizado o exame toxicológico previsto no artigo 148-A, § 2º, incorre em infração gravíssima, que enseja a aplicação de multa multiplicada 5 vezes e suspensão do direito de dirigir por três meses.

 

1 – A quem cabe o pagamento do novo exame toxicológico

Todas as exigências da Lei 14.071/2020, mencionadas até o momento, podem levar ao seguinte questionamento: quem deve arcar com o pagamento para realização do exame toxicológico, o empregado ou o empregador?

Para sanar esta dúvida, importante relembrar o que foi tratado anteriormente, quando do advento da Lei 13.103 de 2015. Naquela oportunidade, a promulgação da lei acarretou a inclusão de diversos dispositivos na CLT – e não apenas no CTB – ocasião em que houve a inclusão, no artigo 168 da CLT, da obrigação do empregador de custear os exames exigidos por aquela lei.

Contudo, a Nova Lei (14.071/2020) acarretou alterações tão somente no CTB, persistindo inalterada, neste aspecto, a CLT.

O silêncio do legislador, ao não discorrer sobre a parte obrigada a arcar com os custos do exame toxicológico exigido, não parece implicar a obrigação do empregador pelo custeio.

Deveras, é possível depreender que, se a obrigação fosse do empregador, o legislador teria, a exemplo do que ocorreu com a Lei 13.103/2015, disposto expressamente acerca desta obrigação, pela alteração da redação da CLT, o que, até o momento, não ocorreu.

Indispensável mencionar, ainda, que o artigo 168 da CLT impõe que o empregador custeie os exames exigidos na admissão, na demissão e periodicamente.

Este dispositivo, precisamente em seu inciso III, pode levar ao questionamento sobre a possibilidade de o exame exigido pela Lei 14.071/2020 ser compreendido como “periódico”, confusão decorrente da exigência de que o toxicológico seja realizado a cada período de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses.

Contudo, a este respeito, cabe frisar que o exame periódico está definido na Norma Regulamentadora (NR) nº 07 e o exame toxicológico exigido por força da Lei 14.071/2020, ao menos a princípio, não se enquadra como um exame periódico.

Para os fins da NR 7, o exame periódico se caracteriza como uma avaliação clínica dos empregados para que seja possível monitorar a saúde física e mental dos trabalhadores considerando os riscos decorrentes da atividade principal desempenhada pela empresa empregadora. Os exames necessários, inclusive, lá estão listados em Quadro Anexo à NR.

A obrigatoriedade de realização do novo exame toxicológico a cada período de 2 anos e 6 meses não o caracteriza como um daqueles exames exigidos periodicamente para os fins da NR 7 (e que ensejam o custeio pelo empregador).

No entanto, vale a ressalva de que não há impedimentos de que sobrevenha regulamentação futura em que conste a obrigação do empregador de custear os exames exigidos pela Lei 14.071/2020, porém, esta não é a situação que se apresenta atualmente.

 

2 – Consequências de não realizar o exame para o motorista e para o contrato de trabalho

Como já tratado inicialmente, o motorista profissional (categorias C, D e E) que conduzir veículo sem ter realizado o exame toxicológico previsto no artigo 148-A, § 2º, incorre em infração gravíssima, que enseja a aplicação de multa multiplicada 5 vezes e suspensão do direito de dirigir por três mesesEsta última penalidade pode ensejar uma outra dúvida, principalmente por parte da empregadora, qual seja: como fica a situação do contrato de trabalho durante esta suspensão?

Para responder este questionamento, importante esclarecer que uma das hipóteses de justa causa abarcada na alínea “m”, do artigo 482, da CLT é a “perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado”.

Assim, por força deste dispositivo, o entendimento predominante que vigora atualmente é o de que, configurado que a reprovação no exame toxicológico ocorreu em decorrência do uso recreativo de substância entorpecente, restaria caracterizada a justa causa prevista na alínea “m”, o que permitiria a rescisão do contrato por justa causa.

Contudo, algumas situações tornar a configuração da dispensa com justa causa mais nebulosa. Um exemplo é a configuração de dependência química, que a depender do caso pode levar à impossibilidade de configuração da justa causa prevista na alínea “m”, do artigo 482, da CLT. Isso deve ser examinado a cada caso especificamente.

 

3 – Conclusão

Assim, com a nova Lei 14.071/2020, os motoristas das categorias C, D e E devem realizar exame toxicológico periódico para obtenção e renovação da CNH. A mesma categoria será submetida a novo exame a cada dois anos e seis meses, a partir da obtenção ou renovação da CNH. Não basta, porém, apenas a realização do exame, sendo imprescindível que o motorista comprove o resultado negativo no toxicológico. A não observância das exigências previstas na Lei pode ensejar as penalidades de multa e suspensão do direito de dirigir por 3 (três) meses, com possíveis efeitos projetados para o contrato de trabalho.

 

Gabriel Gomes Pimentel

Advogado. Especialista em direito empresarial pela FGV.

 

Gabriela Pelles Schneider

Advogada. Mestre em direitos e garantias fundamentais pela FDV.